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Blog das crónicas de Basílio José Dias, publicadas semanalmente no jornal Atlântico Expresso.

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Localização: Ponta Delgada, Açores, Portugal

Tem o Curso Complementar dos Liceus, tendo frequentado o Liceu Nacional Antero de Quental. Serviço Militar de 1940 a 1945. Entrou para a Fábrica de Tabaco Estrela em 1946. Gerente de 1957 a 1989.

26 de dezembro de 2005

Nº 51 O CUSTO DA PAZ (9)

Paz, substantivo feminino. A mulher, encerra o princípio espiritual da conciliação. O abraço, o beijo, o calor emanado, o conselho pacificador, reúnem-se num só «feixe», a prender a tranquilidade ao lar ou a segurar o jacto do arrebatamento relâmpago, não vá a irreflexão desaparelhar o carinho, esteio da conformidade de sentimentos pelo sangue, prolongando-se a usos, costumes e distinção da Lei.
Mulher ... Mãe ... Mulher... são – as duas completam UMA- a mais perfeita obra da Natureza, segundo testemunham os nossos antepassados e mais recentes pensadores já o escreveram em letra de forma. Símbolo da Paz, na gramática igualizam o mesmo substantivo.
Desgosto, a valer, por a feminilidade não consubstanciar a Paz. A firmeza, pode até merecer denominação honorífica de «dama de ferro», não resiste, porém, ao tempo que amacia todo o coração, mas mais madrugador na mulher.
A Paz, não se deleita a respirar o ar saudável da madrugada, nem goza de sono reparador, para se manter firme e confiante. Está sempre de «olho alerta». Precisa de resistência física, pronta para agir nos momentos psicológicos, que são todos os instantes que decorrem no factor tempo, a cargo das chicanas e artimanhas do elemento humano. A Paz, é trabalhosa, exigente de ponderação do que acontece, perante o desconhecido falível. Uma Mãe, não dispõe de tempo e índole para tanto...
A Paz terá de permanecer no substantivo varonil.
A nossa última crónica, continuou a «odisseia da neutralidade portuguesa» no conflito 1939-1945. A firmeza de ânimo, para a manter, respeitou a dignidade da coerência e mereceu o acordo dos dirigentes máximos, daqueles que se guerreavam sem dó nem misericórdia e queriam a maior liberdade do seu lado. Outro problema surgiu. O «volfrâmio».
Este minério, existente na Saxónia, Boémia, China, Coreia, Japão, Austrália, Estados Unidos, América do Sul , etc, há, também em Portugal, minas das mais ricas para extrair o «tungsténio», que serve para temperar o aço e fabricar lâmpadas de incandescência. Foi um bom ganha pão, para muitos portugueses no período da guerra, pois todos os países europeus o importavam para fabrico do armamento.
Nos princípios de 1944, Londres, acompanhada por Washington, solicita a Lisboa, para impedir a exportação de Volfrâmio para a Alemanha. Recusado o pedido, pelos justificados motivos : 1 – dois terços vão para os aliados e um terço para a Alemanha; 2 – O terço provém, de minas de há muito propriedade alemã e em que a Alemanha fez consideráveis investimentos; 3 – Portugal para manter a neutralidade, não pode actuar, desrespeitando direitos adquiridos pelos beligerantes, além de que vasto número de portugueses trabalha nas minas, o encerramento causaria largo prejuízo à economia portuguesa.
Londres concorda com o parecer português, mas coloca o assunto no lado político. O PM português acrescenta que não está disposto a ser arrastado para a guerra, directa ou indirectamente, por causa do problema do volfrâmio e declara ao embaixador da Inglaterra que continuará a prestar a esta todos os serviços que forem compatíveis com a sua consciência. Na imprensa inglesa e na Câmara dos Comuns é agitado o problema, culpando-se o governo português de responsável pelo prolongamento da guerra, no auxílio à indústria de guerra alemã. CHURCHILL, envia carta pessoal, a intervir no assunto, ao Primeiro Ministro Português que contesta os argumentos expostos:- Se a Inglaterra de quem Portugal é aliado e amigo, fosse o único adversário da Alemanha, a perda de vidas britânicas pesaria muito no ânimo do governo português; mas o material de guerra em que a Alemanha emprega minério português, é também utilizado contra outros adversários, cuja actividade hostil à civilização cristã, que a Inglaterra também perfilha, está bem documentada; por outro lado, a Alemanha , em troca do volfrâmio, tem fornecido a Portugal matérias primas essenciais, quando a Inglaterra e os Estados Unidos, não podem fazê-lo; o governo português não quer seguir a atitude de Mussolini, que declarou guerra à França, quando esta já estava derrotada; e, por tudo isto o governo português fiel à amizade e à aliança com a Grã Bretanha, não está, infelizmente habilitado a satisfazer o pedido do primeiro ministro.
Churchill, responde tomando atitude mais de desgosto que de zanga. Um mês depois, porém, acha que deve apertar com Salazar, mas Eden, contém o ímpeto. Este sugere a Campbell que provoque intervenção pessoal do Presidente Carmona, por intermédio de uma filha deste, desenhando cores negras nas relações Portugal/Inglaterra. Salazar é chamado pelo Presidente Carmona e expõe a realidade. Harmonia absoluta entre ambos.
Washington, a pedido de Londres pede ao governo brasileiro para intervir, por intermédio do embaixador em Lisboa. Salazar explica que Londres está a usar o método americano de humilhar os neutros como se estes não possuíssem direitos. E não altera a sua posição.
A pedido de Londres, o primeiro Ministro da África do Sul, SMUTS, apela, empenhadamente para que V. Ex. reconsidere a sua decisão. Salazar respondeu que a concessão de facilidades nos Açores, não pode ser entendida como implicando automaticamente a satisfação de todos os pedidos ingleses, ainda que contrários à neutralidade de Portugal, no caso do minério de volfrâmio para a Alemanha.
Dias depois, para acalmar os interessados, Salazar, propõe ao embaixador britânico, três soluções: 1 – Encerramento das minas que sejam propriedade portuguesa e sobre as quais é livre a decisão do governo, mantendo-se as explorações inglesas, americanas ou alemãs; 2 – fechar todas as minas estrangeiras e vender apenas na proporção anterior, a produção das portuguesas; 3- continuar com a exploração de todas as minas, mas reter em Portugal, o minério proveniente das minas portuguesas, vendendo-o depois da guerra à Grã Bretanha e aos Estados Unidos. Qualquer das três soluções reduziria os fornecimentos de volfrâmio à Alemanha de 1.550 toneladas, para 900 ou 700 toneladas.
Campbell replica que tem ordens para solicitar o total embargo das exportações para a Alemanha, é - lhe defeso discutir, portanto, qualquer das hipóteses sugeridas. Para Londres, todavia, o embaixador dá o parecer de que é afinal a decisão de Oliveira Salazar e nenhuma pressão a modificará e sugere que se tente um compromisso com Portugal, já que a aplicação de medidas drásticas por parte da Inglaterra, não se afigura viável. Não seria de interesse inglês provocar a queda de Salazar e criar o caos em Portugal, comenta Campbell. Eden, opta pelas 700 toneladas máximas para a Alemanha. Churchill, exasperado redige um telegrama para Salazar, em que ameaça por em causa a aliança. De permeio, porém, intrometem-se neste momento os americanos e, em Lisboa, o embaixador Norweb, recebe instruções para exigir embargo total do minério para a Alemanha. Os ingleses previnem os americanos que embargo total, é objectivo inatingível com Salazar e reclamam o direito de ter a última palavra em Portugal. Em 24 de Maio de 1944, o embaixador inglês retoma a questão do volfrâmio. Salazar pergunta: Está a renovar um apelo, ou a invocar a aliança? Pois quer saber se, considerando-se como auxílio a um inimigo da Inglaterra, tudo quanto se fizer quanto à Alemanha, o embaixador entende que a aliança é incompatível com a neutralidade portuguesa. Não responde Campbell e insiste no volfrâmio. Pensa o governo britânico denunciar a aliança? Também não, assegura o embaixador. Nem pode, observa o chefe do governo, porque o tratado está em funcionamento nos Açores.
Até que, em 29 de Maio de 1944, Campbell, entrega uma nota: Fui instruído, em representação do governo de Sua Majestade, para fazer um apelo solene e urgente ao governo português, em nome da Aliança, no sentido de prevenir quaisquer novas exportações de volfrâmio de Portugal para a Alemanha ou outro inimigos de Sua Majestade. Assim, Londres quer fazer funcionar a Aliança, por interesse, iniciativa e um estado de necessidade ingleses.
O Conselho de Ministros, no dia 5 de Junho, aprova o pedido inglês, mas, para manter a neutralidade portuguesa, serão embargadas as exportações, não só para a Alemanha, como para todos os beligerantes, incluindo a Inglaterra.
. No dia imediato, 6 de Junho, forças anglo- americanas, atravessam a Mancha e abrem nova frente de batalha na Normandia. No dia 7, Eden, nos Comuns, elogia a resolução do governo português, considerando-o um serviço comparável ao da concessão de facilidades nos Açores e sublinha que a deliberação de Lisboa fora tomada no dia 5 de Junho, antes de saber da abertura da segunda frente.
Caro leitor, é possível que estejamos a abusar de transcrições do livro do Dr. Franco Nogueira. Desde a adolescência consciente, dezenas de anos passamos a respeitar o Dr. António de Oliveira Salazar, conquanto rumores de incerteza administrativa, lhe tocassem o critério. Atarefado com a profissão, nunca nos deu para clarear as «vozes» que o não gabavam, com acrescentos de o verem longe da governança. Ademais, nunca pertencêramos a agremiações juvenis, nem à Mocidade Portuguesa. A «deposição» do 28 de Maio de 1926, pelo 25 de Abril de 1974, também, não mexeu muito connosco, a não ser a apreensão, no modo de apreciar as questões administrativas, de suma importância nas valências portuguesas.
Agora, porém, aproveitando a aposentação profissional, uma breve visita à América e mais longa viagem pela História, resolvemos dedicar atenção para discernir e tempo no estudo de coisas do passado. Desbastar dúvidas e observar provas de clamores já esquecidos, requer precauções nos diversos apoios do conhecimento. Nem tudo o que luz é ouro. Deve prestar-se, por isso, especial cautela às moedas enferrujadas, para que a oxidação as não destrua por completo e só reste a lenda do enigma ou da incerteza. A verdade é ouro. Paixonetas em tertúlia de facção, contudo, podem corromper-lhe a face e subtrair-lhe o valor.
A imparcialidade é um fim. O alguém que diz não, posta-se ao voltar da esquina. O acontecimento, aflora a justeza.
É tempo de economizar a paciência do leitor. Bons pensamentos.